« Voltar

Richard Dawson & Circle

Vórtice de confluência excêntrica de duas entidades bem sui generis destas últimas décadas. Em geografias e campos operacionais distintos, partilham entre si e cada uma à sua maneira uma certa teatralidade, quase auto-mitológica na forma como escavacam tropes de género em visões alucinatórias. Vindo de Newcastle, Richard Dawson é como que um trovador na demanda de conter toda a humanidade sob a forma de canções-épicos, a arrastar consigo o peso da tradição folk britânica – o cancioneiro tradicional, Roy Harper, John Martyn ou Pentagle - por caminhos inóspitos, fora de tempo e lugar, deixando nesse trilho obras mestras como The Magic Bridge ou Peasant. Os Circle são uma trupe de weirdos finlandeses com mais de três décadas de actividade e uma discografia imensa que segue o chamamento cósmico do krautrock até confins onde este se enlaça com o heavy metal, o rock progressivo, ambient e todo o tipo de fusões num estilo que os próprio denominam de “New Wave of Finnish Heavy Metal”. Desconstruindo tanto noções de géneros musicais quanto a própria postura machista do rock, sublimando os seus trejeitos a níveis bem campy, tomam o palco vestidos de spandex, correntes de picos e mais indumentária over-the-top numa espécie de liturgia celebratória. Henki, disco colaborativo lançado já este ano e cujo título pode ser traduzido por espírito ou fantasma, assenta a sua lírica na natureza e nas propriedades de diversas plantas ao longo da história para assim reflectir sobre o ciclo da vida e da morte, numa banda sonora hipnótica, onde o clamor da voz e a guitarra truculenta de Dawson se enredam com o pulso motorik, o onirismo do art rock, cavalgadas heavy metal e passagens psicadélicas não muito distantes de 'He Loved Him Madly' de Miles Davis, sem nunca perder um fio condutor louvável. A nossa previsão: concerto apoteótico.