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Entrevista a Peter Evans
<30/09/2014>

Trompetista Americano radicado em Nova Iorque, Peter Evans é tão prolífico quanto talentoso – actuando numa larga variedade de projectos  (desde a performance art à música electroacustica) e colaborando com artistas como Evan Parker, Mary Halvorson e Zach Hill. Ao Barreiro, Peter Evans trará o seu Quinteto, com o qual criou e lançou o aclamado “Ghosts”, bem como todo o seu conhecimento e mestria do seu instrumento a uma Masterclass a realizar no Be Jazz Cafe. Falamos então com ele para saber mais. 

OUT.FEST: Há uma review do “Ghosts” online que começa com “Ouvir qualquer disco do Evans suscita frequentemente  um questão dubia: ‘O que é que eu acabei de ouvir?’”  Encaras isso como um elogio?

PETER EVANS: Não li essa review, mas sim – uma resposta à música que inclua perguntas, incerteza, um confronto com algo de novo ou diferente…tomo isso como um elogio.

OF: Tu actuas com vários grupos e projectos diferentes, incluindo os Rocket Science, Pulverise the Sound, Zebulon Trio e Mostly Other People Do The Killing. O que é que distingue o Quinteto desses teus outros projectos, na tua opinião?

PE: Deixei os MOPDtK há pouco tempo mas sim, todas estas bandas têm a sua própria vida, as suas próprias razões para existir, e as suas dinâmicas sociais e músicas distintas. Tocar com bandas é muito importante para mim – eu adoro participar naquele processo de crescimento e mudança, e ver como ele se manifesta na música que a banda produz. O Quinteto é uma espécie de Disneyland para mim – um sitio onde as minhas ideias mais esquisitas, loucas e irracionais podem ganhar forma. Todos os membros desta banda são incrivelmente talentosos e têm uma mentalidade  “no limits” em relação à música, além de terem um largo leque de capacidades a nível músical. Já fizemos tanta coisa, desde músicas como a “Stardust” no “Ghosts” às composições mais monumentais, cinemáticas do “Destination: Void”, e agora em tour estamos a estrear um alinhamento completamente novo que inclui grooves pesadas, novas maneiras de improvisar (para nós) e imensos momentos com solos. O Ron Stabinsky, o nosso novo pianista, é a nossa arma secreta – prestem atenção!

Mais importante ainda é que os músicos na banda partilham um certo sistema de valores e atitude face às actuações comigo – tocar com ENERGIA e desprendimento é imperativo. A comunicação com os outros membros da banda e com o público, a interação com o som e o espaço com uma energia expressiva é essencial e precede todas as outras preocupações.

OF: O teu Quinteto inclui um componente pouco convencional – um portátil, comandado pelo Sam Pluta, que processa digitalmente os restantes instrumentos em tempo real. Podes dizer-nos mais sobre o papel do Sam (e do seu portátil) na banda e o que te atrai no processamento de som em tempo real e outras experiências electroacusticas?

PE: O Sam é um dos meus colaboradores mais importantes, tanto dentro quanto fora do Quinteto. Ele é verdadeiramente erudito no que toca à música – TODOS os tipos de música – e traz esse conhecimento a um instrumento que é muitas vezes bastante limitado. Já fizemos muitas actuações em duo, bem como composições em grande escala com conjuntos de sopros, música do Duke Ellington, toda a música do Quinteto…Por isso, é uma combinação das suas qualidades e valores enquanto músico, juntamente com o instrumento que usa, que o torna importante para mim. Se ele não existisse provavelmente não teria o Quinteto enquanto banda. Não conheço mais ninguém com um conjunto de capacidades tão alargado, com a sua rapidez de improvisação, percepção de estruturas musicais e sonoras, capacidade de lidar com pautas e adaptabilidade em geral. Os sons que ele traz ao grupo são simplesmente impossíveis de alcançar de qualquer outro modo e já progrediram muito além de simplesmente seguir instrumentos individuais. O papel dele é muito variável, como todos os outros na banda. Às vezes ele está audivelmente ligado a um instrumento específico, às vezes é o solista principal e depois há tudo o resto entre esses dois pontos. Acho que todos nós tentamos ser capazes de adaptar os nossos instrumentos para servir todos esses papeis. Ele só está a faze-lo com um computador.

OF: Tu já actuaste com o Peter Brötzmann (que também vai actuar nesta edição do OUT.FEST) – podes falar-nos um pouco dessa experiência?

PE:  Sim, já tive a sorte de tocar com o Brötzmann umas quantas vezes. A experiência mais interessante foi um par de concertos em Outubro de 2008 na Alemanha. Foi com o trio Full Blast dele mais o Keiji Haino, o Mars Williams e eu.  Foi incrível, e a banda era mesmo louca demais para estarmos todos a tocar ao mesmo tempo. O Peter acabou por nos por em combos pequenos, o que foi óptimo. Ele tem uma voz única com um alcance expressivo muito alargado. Os duos dele com o Haino (acho que o Peter tocou Taragato) foram lindos.

OF: O que podemos esperar da tua Masterclass e da tua actuação no OUT.FEST?

PE: A Masterclass vai ser muito livre. Não planeio este tipo de coisa com antecedência. Talvez toque durante uns minutos para começar, espero que outras pessoas também toquem, e podemos falar um pouco sobre a música e sobre a vida. Quanto ao concerto, não sei mesmo dizer. Vamos começar a tour cedo – temos três noites de seguida este fim de semana em Nova Iorque, e depois dois concertos na Europa (Viena e Amsterdão) antes do concerto no OUT.FEST. Já devemos estar preparadissimos nessa altura, espero. Temos imensa música nova para tocar, mas acho que vamos tocar uma do novo disco, o “Destination: Void”.

O Peter Evans Quintet actua na sexta feira (3 de Outubro) na Casa da Cultura, juntamente com Fennesz e Dean Blunt, numa noite de música experimental que atravéssa géneros. 

Entrevista a Fennesz
<29/09/2014>

Desde o lançamento do “Endless Summer” (2001), obra-prima da fusão musical entre o digital e o orgânico que o guitarrista e músico electrónico austriaco Christian Fennesz (mais conhecido apenas por Fennesz) é aclamado como uma importante figura da música experimental. Falamos com ele sobre “Bécs” (pronuncia-se “betch” e é o nome da cidade onde Fennesz reside, Viena, em Húngaro), o seu mais recente registo pela Mego, bem como sobre o seu método em actuações ao vivo e sobre o potencial da utilização de tablets na produção de música.

OUT.FEST: Ao longo da tua carreira, tens vindo a combinar ondas de ruído e sons ‘glitchados’ e manipulados com instrumentos ‘convencionais’, especialmente guitarras. Esta tendência é ainda mais visível no teu último disco, o “Bécs”, no qual o baixo e a bateria aparecem de forma mais proeminente do que no passado. O que é que te atrai nesta fusão entre orgânico e digital, e em termos de som, o que é que procuras ao processar estes instrumentos?

Christian Fennesz: Bem, o Tony Buck, o Werner Dafeldecker e o Martin Brandlmayer estavam por Vienna e eu convidei-os a virem tocar ao meu estúdio. Queria ter uma espécie de abordagem de ‘banda’ nalgumas músicas. Ao inicio nem estava a pensar muito em processar os instrumentos, porque estava a gostar do som muito tradicional que saiu daquelas sessões de estúdio. Mas acabei por processar a bateria, soou-me interessante assim.

OF: Já mencionaste várias vezes a tua apreciação  por ‘acidentes’ de estúdio, sons gerados de maneiras que podem correr ‘mal’, que não saem como o esperado, e no entanto trazem um toque inesperado e interessante a uma música. Há muitos destes acidentes no “Bécs”? E se sim, há algum deles que se destaque, na tua opinião?

 

CF: Não existem assim tantos desses acidentes no “Bécs”, excepto no que toca às baterias processadas. No “Bécs” optei por uma abordagem mais directa – algumas das músicas surgiram de improvisações em estúdio mas no geral é um disco muito “composto”.

OF: Foste um dos primeiros artistas a usar o portátil como um instrumento, especialmente num contexto de música ao vivo. Apesar disso ser mais comum nos dias que correm, muitas bandas continuam a usar o portátil principalmente como uma maneira de lançar samples e faixas de acompanhamento, enquanto que tu também o usas como um processador de efeitos e uma ferramenta improvisacional. É esta versatilidade que te atrai no uso de software como um instrumento? Já experimentaste usar tablets da mesma forma?

CF: Eu continuo a gostar de usar software como um instrumento. Lançar “backing tracks” pode ser necessário num contexto de banda, mas para mim enquanto performer a solo seria um pouco aborrecido.

Por muito fantastico que o Ableton “Live” seja, ele nunca funcionou bem comigo num contexto de performance ao vivo. Continuo a usar o “ppooll”, um patch escrito em max/msp [uma linguagem de programação para música e multimédia]. Para mim, é a ferramenta de improvisação perfeita.

Comecei a usar tablets desde que o primeiro iPad saiu, e até usei um nalguns pontos do “Bécs”.

Fennesz actua na sexta (3 de Outubro) na Casa da Cultura, juntamente com o Peter Evans Quintet e o Dean Blunt. 

Entrevista aos Magik Markers
<26/09/2014>

Com actuação marcada para sábado (4 Out), os Magik Markers trazem o seu noise-rock experimental ao Barreiro para um concerto que promete ser explosivo e visceral. Entretanto, conversámos com o Peter Nolan sobre o último disco da banda e o papel da espontaneidade na sua música.

OUT.FEST: O “Surrender to the Fantasy”, o vosso disco mais recente (lançado no ano passado), é de algum modo difícil de categorizar (e isto é uma coisa boa), mudando (às vezes drasticamente) entre estilos e estados de espírito de faixa para faixa. Na vossa opinião, qual é a ligação - se é que há uma - entre estas músicas?  

Magik Markers: Estamos a contar uma história , ou pelo menos esperamos que sim…Há muitos lados no dado que são os Magik Markers…não nos queríamos limitar…Mas compilar  um disco a partir de anos de gravações foi um grande desafio….estamos muito contentes com ele e esperamos que o disco leve as pessoas numa viagem que elas curtam…A minha versão favorita do disco é a de uma hora que vêm em USB.

OF: A vossa música transmite frequentemente uma sensação de espontaneidade mesmo nas vossas faixas mais estruturadas, sendo pouco ou nada polidas, como se estivessem a tentar transmitir sensações e ideias da forma mais crua e pura possível. Diriam que essa é uma descrição adequada do que tentam fazer musicalmente?

MM: Sim, sem dúvida. Muito do material foi espontâneo…passamos muito tempo…quatro anos…a compilar gravações…e também passamos muito tempo a misturar coisas com o Aaron Mullan [de Tall Firs]… Ele já trabalha connosco há muito tempo e tem uma boa ideia do que somos enquanto banda. É um trabalho de família…Este é o nosso disco menos apressado e mais representativo da nossa banda até agora.

 OF: Vocês são conhecidos por gravar e lançar várias cassetes e CDs por ano, particularmente antes da pausa entre o Balf Quarry e o Surrender to the Fantasy. Têm algum plano para voltar a lançar algumas dessas gravações online para um público mais alargado (na Arbitrary Signs, talvez)? Ou um Gucci Rapidshare Download parte dois, pelo menos?

MM: Temos feito imenso trabalho de arquivo na página de bandcamp da Arbitrary Signs, e temos planos para continuar a fazê-lo, definitivamente.

OF: Nalgumas das vossas entrevistas, vocês mencionam que muito do “Surrender to the Fantasy” foi escrito na cave da casa do pai da Elisa. O que é que ele acha desse disco e da vossa música em geral?

MM: Só numas quantas músicas. O pai da Elisa é um grande fã. Ele até tocou bateria connosco num concerto. Costumávamos ensaiar na cave dele quando ela funcionava como uma espécie de ponto intermédio entre Nova Iorque e Massachussets…Foi uma espécie de regresso às nossas origens.

OF: O que podemos esperar da vossa actuação no OUT.FEST?

MM: Nós nascemos para rockar…nunca seremos estrelas de opera. 

 

Os Magik Markers actuam  sábado (dia 4) à noite no Pavilhão do G.D. Ferroviários, juntamente com Putas Bêbedas, The Ex e Faust, para uma noite inesquecível de rock’n’roll exploratório. Mais informações sobre este concerto e sobre o festival em outfest.pt.

Entrevista a Rodrigo Amado
<23/09/2014>

Rodrigo Amado é há décadas uma das grandes referências do jazz nacional, tendo vindo também a receber cada vez mais elogios da imprensa e público internacional. Em antevisão ao concerto com a mais recente das suas formações a estrear-se em disco, o Wire Quartet, conversamos com ele sobre este quarteto, bem como sobre os seus últimos registos e a importância da improvisação na sua música.

OUT.FEST: Lançaste três (!) discos este ano - um albúm epónimo com o teu Wire Quartet, projecto com o qual vais actuar nesta edição do OUT.FEST, e ainda o Freedom Principle  e o Live in Lisbon em colaboração com o Peter Evans, que também vai marcar presença no Barreiro com o seu Quinteto. Além disso, segundo a tua entrevista ao DN, ainda vem ai mais um (!!) – há alguma coisa que nos possas dizer sobre ele?

Rodrigo Amado: O próximo disco a ser editado é o quarteto com o Joe McPhee, o Kent Kessler e o Chris Corsano.

É uma gravação de estúdio e sai perto do final do ano pela editora polaca Not Two.

É um álbum que concretiza a enorme vontade que tinha de gravar algo com o Joe McPhee, um dos mais importantes improvisadores em actividade e uma enorme inspiração.

Ele representa o tipo de músico em constante renovação / reinvenção, practicando uma música universal, que não tem idade.

 

OF: Fala-nos um pouco sobre a tua nova formação, os Wire Quartet. O que é que te levou a querer colaborar com o Manuel Mota nesta formação?  Que tal tem sido a recepção ao disco de estreia e aos concertos deste projecto?

RA: O Wire Quartet foi criado sobretudo a partir de uma enorme vontade de trabalhar com o Manuel Mota.

A música dele sempre me fascinou e dei por mim a pensar num contexto em que poderíamos partilhar linguagens, afastando-nos um pouco da música que ele toca habitualmente.

Depois de uma primeira experiência com o Peter Bastiaan no lugar do Gabriel, chegámos a esta formação com o Hernâni Faustino no contrabaixo e o Gabriel Ferrandini na bateria, com a qual espero continuar a trabalhar durante muitos, muitos anos.

A recepção ao disco tem sido incrível e apanhou-nos a todos um pouco de surpresa. A música que gravámos é particularmente densa e intensa, nada fácil, mas isso não impediu que se gerasse um enorme interesse por parte da imprensa internacional. O lendário Brian Morton, um dos responsáveis pelo Penguin Guide to Jazz Recordings, escreveu: “When most of our laudatory paradigms for music involve elevation, ascension, transcendence, Amado takes us toward the core. This is his most thrillingly realized and coherent recording to date.” (Quando a maioria dos nossos paradigmas laudatórios para música passam pela elevação, ascenção, transcendência, Amado leva-nos em direcção ao âmago. Este é o seu disco mais arrebatador, conseguido e coerente até hoje.)

OF: És um defensor acérrimo da improvisação enquanto forma de expressão musical, tanto com os Lisbon Improvisation Players, que formaste, como na tua restante obra. Podes falar-nos sobre o que te atrai nesta forma de criar música? Tiveste um bom entendimento com o Peter Evans nesse campo?

RA: Aquilo que mais me atrai na improvisação é a sua verdade e a profunda ligação ao momento. É a disciplina musical onde os músicos mais se expôem, e revelam. É virtualmente impossível tentares ser quem não és. Também por isso, é uma disciplina que dá origem a uma música mais pura do que o habitual, aproximando-se, em termos metodológicos e emocionais, às raízes mais longinquas da música. A ligação ao momento faz com que toques uma música vibrante, vital, em permanente actualização. Uma música que acaba por transmitir toda a tua evolução, não apenas como músico, mas também como pessoa.

O entendimento com o Peter Evans foi incrível, intenso e profundo, apesar de termos linguagens e estéticas totalmente diferentes. Foi uma comunicação por conflito, confronto e contraste, que deu resultados fascinantes e me mudou de forma permanente como músico, uma vez mais.

OF: O que podemos esperar do teu concerto no OUT.FEST?

RA: Uma entrega total e uma música que é, para nós, urgente e vital. Tão séria quanto as nossas vidas.

 

Os Rodrigo Amado Wire Quartet vão actuar na tarde de sábado (4 de Outubro) no Be Jazz Cafe, juntamente com os Open Mind Ensemble – dois concertos do melhor que o Jazz nacional tem para oferecer. Como se não bastasse, estas actuações são de entrada livre.